Apocalipse por William Blake

O Dragão Vermelho e a Mulher Vestida de Sol

Projeto Xaoz
6 min readApr 25, 2018

William Blake foi um poeta e pintor que viveu entre 1757 e 1827, na Inglaterra. Suas obras são, em sua maioria, enigmáticas e voltadas para temas relacionados à mitologia cristã, incluindo passagens bíblicas. Outras de suas obras foram supostamente recebidas por meio de visões e sonhos, reveladas ao autor por forças cósmicas superiores. A série de quadros do Dragão Vermelho, pintada em aquarela, se enquadra nas duas categorias.

Esta série é composta por pelo menos 4 obras que apresentam passagens do Apocalipse bíblico, e foi encomendada ao pintor junto a outras obras com o objetivo de ilustrar a Bíblia. Porém, as obras acabaram adquirindo um caráter mais pessoal e incluíram muitas das percepções individuais do autor. Estes quadros já foram citados em outras obras literárias e audiovisuais, sendo por exemplo apresentados na série de filmes da saga Hannibal.

Imagem: O Grande Dragão Vermelho e a Mulher Vestida de Sol, por William Blake.

Estes quadros possuem relação direta com o Apocalipse, da Bíblia. Neste sentido, há significados metafísicos complexos por trás de cada símbolo, e dos elementos utilizados.

A Mulher Vestida de Sol

Segundo a Bíblia, Apocalipse 12:

“E viu-se um grande sinal no céu: uma mulher vestida do sol, tendo a lua debaixo dos seus pés, e uma coroa de doze estrelas sobre a sua cabeça. E estava grávida, e com dores de parto, e gritava com ânsias de dar à luz”.

Esta passagem contém o simbolismo utilizado nas representações da Nossa Senhora da Conceição, e também é representada por outros pintores. O evento astrológico que tem sido relacionado com essa passagem é o posicionamento da constelação de Virgem com Júpiter em seu ventre, a lua sob os pés, 9 estrelas + 3 planetas sobre sua cabeça (=12), iluminada pelo sol, configuração que ocorreu mais recentemente no ano de 2017.

O número 12 está relacionado ao cosmos como um todo, possuindo ao mesmo tempo a primeira centelha ou unidade diferenciada do caos primordial (1), a oposição de princípios (2), e a interação entre a unidade e seu oposto (1 + 2 = 3), que possibilita a formação de tudo. Representa também os 12 signos que encerram em si todos os aspectos mentais e espirituais possíveis.

Imagem: O Número da Besta é 666, por William Blake.

Sendo assim, a mulher vestida de Sol, nesta representação, é quem dá origem a tudo, uma última vez, antes do Juízo Final. A Concepção do Cosmos é mais uma vez encenada, sob as vistas do Dragão. Por outro lado, esta parte do Apocalipse pode se tratar do início de tudo, já que a Mulher consegue fugir da destruição posteriormente.

O Grande Dragão Vermelho

Segundo a Bíblia, Apocalipse 12:

“E viu-se outro sinal no céu; e eis que era um grande dragão vermelho, que tinha sete cabeças e dez chifres, e sobre as suas cabeças sete diademas. E a sua cauda levou após si a terça parte das estrelas do céu, e lançou-as sobre a terra; e o dragão parou diante da mulher que havia de dar à luz, para que, dando ela à luz, lhe tragasse o filho. E deu à luz um filho homem que há de reger todas as nações com vara de ferro; e o seu filho foi arrebatado para Deus e para o seu trono”.

Júpiter, na mitologia Grega, é Zeus, que combate seu pai, Cronos, com ajuda da mãe. Cronos pretende engolir todos os filhos assim que nascerem, assim como o Dragão Vermelho citado, porém é iludido ao ser colocada uma pedra no lugar de Zeus. O Deus, então, sobrevive, cresce e retorna para a sua vingança, fazendo Cronos vomitar todos os filhos que havia engolido (novo início). De certa forma, os raios que representam o poder de Zeus são equiparáveis a “varas de ferro”, porém sendo fabricados a partir de outros metais por Hefesto.

Da mesma forma, neste trecho, Jesus seria o filho que consegue evitar a morte e retorna para derrotar o Pai, o princípio ativo e dispersor, descontrolado, que quer destruí-lo.

A derrota do Dragão

Segundo a Bíblia, Apocalipse 12:

“E a mulher fugiu para o deserto, onde já tinha lugar preparado por Deus, para que ali fosse alimentada durante mil duzentos e sessenta dias. E houve batalha no céu; Miguel e os seus anjos batalhavam contra o dragão, e batalhavam o dragão e os seus anjos; Mas não prevaleceram, nem mais o seu lugar se achou nos céus. E foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente, chamada o Diabo, e Satanás, que engana todo o mundo; ele foi precipitado na terra, e os seus anjos foram lançados com ele (…). Por isso alegrai-vos, ó céus, e vós que neles habitais. Ai dos que habitam na terra e no mar; porque o diabo desceu a vós, e tem grande ira, sabendo que já tem pouco tempo”.

Imagem: O Grande Dragão Vermelho e a Besta do Mar, por William Blake.

“Os que habitam nos céus” podem ser relacionados com as pessoas que já possuem um modo de pensamento próprio do próximo paradigma, a Era de Aquário (ar), ou seja, pessoas focadas na razão e na espiritualidade, da mesma forma que a mulher ganha asas de águia (elemento Ar) para conseguir se safar. Já “os que habitam na terra e no mar” podem ser aqueles relacionados às Eras anteriores, entre elas Touro e Peixes (terra e água), ou seja, pessoas demasiadamente presas aos bens materiais e à emoção exacerbada (falta de controle emocional e de autoanálise).

Há também menção a estrelas caindo (meteoros, cometas), a um grande rio (tsunamis, maremotos), e à terra abrindo sua boca (terremotos), que podem ser metafóricos ou literais.

A fuga para o deserto

Segundo a Bíblia, Apocalipse 12:

“E, quando o dragão viu que fora lançado na terra, perseguiu a mulher que dera à luz o filho homem. E foram dadas à mulher duas asas de grande águia, para que voasse para o deserto, ao seu lugar, onde é sustentada por um tempo, e tempos, e metade de um tempo, fora da vista da serpente. E a serpente lançou da sua boca, atrás da mulher, água como um rio, para que pela corrente a fizesse arrebatar. E a terra ajudou a mulher; e a terra abriu a sua boca, e tragou o rio que o dragão lançara da sua boca. E o dragão irou-se contra a mulher, e foi fazer guerra ao remanescente da sua semente, os que guardam os mandamentos de Deus, e têm o testemunho de Jesus Cristo”.

Enquanto “ânima” de nossa psique, a mulher vestida de Sol vai para o deserto, onde fica protegida. O simbolismo do deserto é o de jornada, mesmo que seja de autoconhecimento (guiada pela ânima). A passagem dos judeus para uma nova Era, em Êxodo (finalização de um ciclo de dominação, busca de um novo início) também incluiu a travessia pelo deserto.

Por outro lado, como já mencionado, e entendendo esta passagem como uma re-encenação do surgimento do Cosmos, pode ser observado que o princípio paterno/ativo da repulsão não foi capaz de vencer o princípio materno/passivo da atração, que conseguiu unir a matéria e formar planetas onde a Vida é possível.

Imagem: O Grande Dragão Vermelho, por William Blake.

Em Apocalipse 12, pelo que se observa, não é descrita uma finalização completa — e talvez por isso esta passagem ainda suscite tanto fascínio ao ser analisada à luz dos conceitos metafísicos. Trata-se de um novo início, ou mesmo do início de tudo. Pelos enigmáticos traços de William Blake nesta série de quadros, é possível contemplar a magnitude desta passagem.

Por: RoYaL

Referências: A Bíblia de Jerusalém

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