Duat
O Submundo Egípcio
O Livro do Amduat é um livro funerário real. Ao contrário do livro dos mortos, que é uma sequência de ritos e feitiços para o morto, o Amduat ou “Como é no Duat” é um mapa do Reino de Osíris e este mapa secreto somente os deuses e o Faraó, como deus encarnado, poderiam conhecer. É a parte do submundo onde o Deus Rá entra no final do dia.
Após morrer no Horizonte Oeste, ele atravessa o portal para o submundo e inicia sua jornada em busca da reconstrução de seu próprio ser durante as doze horas da noite até renascer um novo deus, Khepra, o Sol Nascente, no Horizonte Leste.
Essa viagem do Grande Deus foi inserida em algumas tumbas reais como se o próprio faraó fizesse a mesma viagem, que compreende uma série de transformações a serem feitas até renascer com luz plena. A viagem inicia-se com a perda do corpo físico e liberação do Ba, a alma mais densa. Região após região, acontecem transformações para recompor o ser de forma que ele renasça em esplendor, esteja na companhia dos deuses e seja um igual.
O Tarot de Thoth foi ilustrado magistralmente por Frieda Harrys a pedido de Aleister Crowley, com base em seu Livro de Thoth. Nele, são representados deuses egípcios e motivos alegóricos relacionados a mitos egípcios e visões de Crowley, e portanto estas cartas serão utilizadas como ilustração devido a aspectos correlatos a cada uma das 12 Horas.
1: Portal para o Duat (Abandono do Khat)
O nome da Deusa da primeira hora é “A Que Rasga a Testa dos Inimigos de Rá”. O nome do primeiro campo é “Rio de Rá” e seu guardião é “Aquela da Chama Dupla”.
Chegando ao portão do submundo, Rá, sob o aspecto de Atum (Deus ancião), abandona seu corpo físico antigo e assume sua forma no submundo, A Carne. Aqui o Grande Deus ordena que seja aberto o portão para que ele passe. Serpentes guiam a sua barca para que siga adiante. A deusa Neith se apazigua.
Neith, A Radiante, é uma Deusa da Guerra pré-dinástica também associada ao culto funerário como protetora dos mortos e que auxilia a passagem pelas águas do submundo. Inicialmente tem o escaravelho como animal, mas também possui uma coruja, abelha, peixe ou leoa. É mostrada também amamentando Sobek.
2: Embarque na Barca Noturna com o Ba (Alma)
O nome da Deusa da segunda hora é “A Sábia que Protege Seu Senhor”. O nome da porta desta cidade é “A Devoradora de Tudo”. O guardião é “Aquele que Está na Chama Dupla”.
Rá se purifica e entra na Barca Noturna com seu Ba. Aqui os habitantes do Duat saúdam o Grande Deus como “Carne Divina”, o nome de seu Ba no submundo, e o alimentam com oferendas de grãos, pão e cevada para que se fortaleça. Em troca, ele anima esses habitantes com ar, luz, e reverte a decomposição dos corpos.
3: Pesagem. Recebimento do Coração por Osíris (Ib)
O nome da Deusa da terceira hora é “A que Corta em Pedaços os Ba’s”. O nome da porta desta cidade é “A que Agarra”. O nome deste campo é “A Água do Senhor Único que Cria as Oferendas”. O nome do guardião desta região é “O Que Restringe”.
Aqui, Rá encontra diversos habitantes que são responsáveis por destruir os Ba e aniquilar sombras (Khaibit), destruindo os que “Não Nasceram” e ateando fogo neles. Após, os deuses o adoram e Osíris o aclama, pois o Grande Deus foi justificado por Maat. Com a aprovação de Maat, recebe seu Ib (coração) e poderá viver plenamente com todas as suas formas, com ar, vendo, ouvindo, e com água pura. Vive, vem à existência e passa a não pertencer ao lugar de destruição. Ele sai desta região com suas formas unidas, pois através do Ib ele adquire consciência e começa a uni-las.
4: Encontro com as Sombras (Khaibit)
O nome da Deusa da quarta hora é “Aquela Cujo Poder é Grande”. O nome dessa região é “A Existência das Formas”. O nome da porta é “A Que Oculta a Ancoragem”.
A Câmara Oculta do Oeste é a entrada do deserto de Sokar. Aqui Rá não enxerga as formas, somente escuta as palavras. Hórus é quem oculta as formas e os habitantes também não o veem. Existe um caminho que atravessa esse lugar, chamado Caminho de Rosetau. Vai diretamente à Imhet, a necrópole de Sokar, deus com cabeça de falcão, cultuado em Mênfis. Com isso, Rá adquire o Khaibit, a sombra do seu ser.
Sokar era o protetor de Sakara, grande necrópole menfita. Na quinta dinastia foi associado à Ptah e posteriormente sendo uma das formas de Osíris. Esta associação com Ptah faz dele um grande artesão do submundo e responsável pelas primeiras transformações do viajante do Duat.
5: Despertar do Poder (Sekhem)
O nome da Deusa da quinta hora é “A que Guia dentro de Sua Barca”. O nome dessa região é “Aquela do Oeste”. O nome da porta é “Ponto de Parada dos Deuses”.
Aqui é O Lugar Sagrado na Terra de Sokar (metade superior do Deserto), onde o ser está em suas primeiras formas de manifestação. A Barca noturna se transforma em uma serpente para se locomover na areia. Sete deuses e deusas o guiam. Ele desperta a Enéade, a extensão do poder criativo, e os estabiliza, exigindo adoração aos deuses protetores das águas do Duat. Rá avista um montículo de terra com nome de “Noite” de onde se ergue sua futura forma restaurada, um escaravelho. Ele o desperta e duas serpentes confirmam que ele se ergueu e que está próximo de Khepra. Oito deuses ao redor também são despertos e potencializados, Rá os dá voz e potência mágica para que executem os inimigos. É exigida a passagem pela Serpente Sagrada, que abre caminho para o Grande Deus.
Nove deuses saúdam o Grande Deus, enaltecendo suas qualidades mágicas. Ele avança e é saudado novamente por outras deusas que o enaltecem, chamando-o de Senhor dos Poderes do Horizonte.
No final dessa região, encontra o Ovo de Sokar num montículo de terra. O ovo é iluminado pelos olhos de Rá e racha com o som de uma tormenta. Aker, “Os Dois Horizontes”, está ao lado, e o Grande Deus deixa “O Escaldante”, aquele que vive do alento ardente, protegendo-o.
“Aquela do Oeste”, o nome desta região, é um dos epítetos de Ísis quando se encontra no seu aspecto funerário, ao lado de Osíris no Duat. Ísis é a senhora da magia e única com o poder de controlar o universo no lugar de Rá, por possuir seu nome oculto (Ren).
Serpentes são sempre vistas como representações do poder divino e a Barca Noturna se transforma em uma para levar o Grande Deus. Khepra é o Deus escaravelho que irá se erguer. O ovo possui o simbolismo de nascimento. Nos mitos, Khnum, divindade criadora de Elefantina, cria um Ovo do qual Rá nasce. No submundo, quem faz esse ovo é Sokar.
6: Fusão com Osíris (Akh)
O nome da Deusa da sexta hora é “Mesperit, A que Proporciona o Caminho Correto”. O nome dessa região é “Senhora dos Habitantes do Duat”. O nome da porta desta cidade é “Aquele das facas Pontudas”.
Nesta região, a Barca sai das areias de Sokar e chega num rio. Rá invoca nove deuses, aspectos de outros como Isis, Osíris e Hórus, os ordena e os fortalece. Encontra nove nobres do Alto e Baixo Egito, os exalta e confirma suas majestades na terra. No alto do local, há um leão, O “Ka Que Ruge” junto de Ísis em seu aspecto de tecelã.
Em seguida, encontra dez formas misteriosas, que são aspectos de alguns deuses como Heka, divindade que personaliza o poder mágicko e os ordena, iluminando a escuridão em seguida. Continua a navegar pelo rio da região e atraca em uma margem onde se encontra a Mansão de Osíris, que o chama. Mais uma vez, saúda os antigos reis que estão na companhia de Osíris, e Thoth está à frente do Bom Deus. Ao fazê-lo, designa os Ka aos reis e entrega oferendas.
A imagem de Rá como Khepra envolto por uma serpente está presente. “Este é o corpo de Khepra em sua carne (…). O Oeste em sua totalidade vem a ele”. Por último, evoca os aspectos serpentes da Enéade mais uma vez, os fortalece e os ordena a castigar os inimigos que passarem por lá e a jogarem-nos no “Local de Destruição”.
Nesta região, o Grande Deus, ao encontrar Osíris, se une a ele, no momento em que Rá é identificado como Khepra em Sua Carne.
Osíris representa o Ka de Rá, ou seu Eu no Submundo. Ao fundir Ba e Ka tem-se o Akh, ou o espírito completo, o Eu com Consciência Plena. Até aqui, o Grande Deus já possui consciência, sombra, espírito completo e poder.
7: Rá Vence Apep (Ren)
O nome da Deusa da sétima hora é “A Que Repele a Serpente Hiu e Corta a Cabeça da Neha-Her”. O nome desta cidade é “Cova Misteriosa”. O nome da porta desta cidade é “Portal de Osíris”.
Aqui Rá assume outra forma, a de um carneiro envolvido por uma serpente. É chamado de “Serpente Envolvente” ou “A Que Envolve”. A Barca segue com os poderes mágicos de Isis e o chamado Mago Antigo (não é informado quem seria esse mago, porém supõe-se ser Heka). Rá encontra “A Carne de Osíris” dentro da serpente “A que Envolve”, que na verdade é ele mesmo, pois é Rá quem está dentro desta serpente. Ele o nomeia exaltando diversos epítetos. Ao enumerar os títulos e os aspectos ele está se nomeando, adquirindo o Ren, o Nome Oculto com o qual governa o universo. Vira-se, em plena posse de seus poderes, para os inimigos deitados no chão e os amaldiçoa. Em seguida exalta três Ba’s divinos e a comitiva divina, aumentando seus poderes mágicos.
Chega o momento em que a comitiva encontra Apep, uma serpente com vértebras de 221 metros. A serpente caótica chega com seus seguidores na margem Sandyau. A voz de Rá traz os deuses e a própria serpente até ele, que oculta seu Disco Solar ao ver Apep. Neste mito usado no Amduat, Selkis e uma divindade chamada “A Que Manipula as Facas” enfrentam a serpente gigante para proteger o Grande Deus; em outros mitos, quem enfrenta a serpente pode ser Seth ou Bast (dentre outros deuses). Enfraquecem Apep e laçam seu corpo violentamente. Elas castigam Apep, também chamado de Face Maligna, com as facas, até sobrepujá-lo, e em seguida aniquilam a comitiva caótica da serpente. Diversos deuses se manifestam para ver a luta que manterá a Ordem Cósmica, dentre eles Atum, Khepra e Osíris. Após a luta, se recolhem.
Esta luta mítica é a alegoria de uma verdade metafísica de que tudo retornará ao Caos que é Nun. Um dia Apep irá impedir a viagem de Rá pelo Duat e a ordem será abalada, forçando Rá retornar ao leito do Oceano Primordial. Com isso, todos os deuses e a criação serão aniquilados, sobrando somente Osíris junto ao Grande Deus no Nun, o Deus Criador junto ao Deus que Renasce.
Após o embate, a viagem continua e Rá segue com sua comitiva até uma sala onde encontra Hórus entronado. Ali Hórus está de frente para dezenas de divindades estrelas e ele é o responsável por fixá-las no corpo de Nut, afirmando sua posição de divindade que reina no céu, colocando-as em movimento, ajustando assim, as horas noturnas.
No final da sala, que é o final dessa região, encontra-se um grande crocodilo: Abesh, o Maligno do Lago. Ele guarda a imagem da cidade. Ao ouvir a comitiva do Grande Deus, ele se levanta e dele sai o Grande Olho, que, nesse momento, somente presencia a passagem de Rá.
8: Sarcófago Divino (Útero do Submundo; Sahu)
O nome da Deusa da oitava hora é “Senhora da Noite”. O nome desta cidade é “Sarcófago dos Deuses”. O nome da porta desta cidade é “A Que Permanece Sem Cansar”.
Rá entra na caverna “A Secreta” e vê as formas de Shu, Atum e Khepra (o que irá erguê-lo, sua forma antiga e sua futura forma) e chama pelos seus Ba’s que retornam louvores. Ao sair, navega pela cidade (Sarcófago dos Deuses) quando os deuses que lá habitam escutam o poder da voz divina e se erguem da areia, sendo iluminados pela sua luz. Ganham vida e recitam louvores quando o Grande Deus os chama pelos seus nomes. Estes deuses são responsáveis por atacar com facas os inimigos que passarem por esta área. Quando Rá passa, afundam na areia novamente. Quatro aspectos de Tatenen em forma de carneiro se aproximam de Rá e todos se regozijam. Rá coroa Tatenen, que retorna para seus domínios.
Em seguida entra em outra caverna, “Descanso do seu Senhor” e descansa antes de prosseguir.
Chega à outra caverna, “Aniquilador de Malfeitores” onde encontra quatro múmias e passa por outra porta, “Faca Daquele de Formas Poderosas”. Mais uma caverna, “A que Mantém Longe seus Ba’s” e passa por outra porta, “A Faca, Chama Pontuda”. Enfim, entra na última caverna desta região, “Aquela da Chama Grande” e encontra quatro serpentes, saindo em seguida pela porta “A Faca dos Espíritos” que levará a outra região.
O sarcófago é uma representação de Geb e Nut, o piso era decorado com símbolos de Geb e a tampa com símbolos de Nut. O falecido ficaria envolvido pelos deuses guardando sua forma física. Neste caso, no submundo, a cidade é como um útero que gera a forma que irá renascer, seu Sahu, o corpo do espírito. Rá vê sua antiga forma, Atum, e sua nova forma, Khepra, junto com Shu, o primeiro faraó após abdicação de Rá e uma de suas formas conforme a Litania de Rá.
Em seguida encontra com quatro formas de Tatenen (ou seus quatro elementos), Deus das Terras Profundas e aquele que gera as formas sob o aspecto de Ptah-Tatenen ou Khnun-Tatenen e o coroa como uma forma de agradecimento, descansando em uma caverna após o encontro com Tatenen. Passa por quatro cavernas nas quais encontra múmias que voltam à vida, e por fim quatro serpentes, que são símbolos do poder divino. Elas se chamam: A Chama, A Enrodilhada, A Que Se Ergue, A Veloz. São aquelas que darão a força vital para nova forma.
9: Morte Vencida
O nome da Deusa da nona hora é “A Que Protege Seu Senhor”. O nome desta cidade é “A Que Vive Para as Transformações”. O nome da porta desta cidade é “Guardião da Inundação”.
Rá encontra doze deuses e, através de seu poder, solicita que eles ergam suas cabeças e vivam. Solicita que eles adorem ao deus Osíris, Senhor do Duat. Vira-se para doze deusas que, em seus corpos e formas, respiram e vêm à vida quando escutam o Grande Deus. Elas são quem elevam Osíris e anuncia a Vida quando Rá chega nesta região. Em seguida eles entram no séquito de Osíris.
Agora, permanecem na barca do Grande Deus somente os deuses relacionados à vida e renascimento, como: “O Que Ignora a Aniquilação”, “O Que Ignora o Cansaço”, “O Que Ignora Retirada” e “O Que Ignora o Decaimento”.
Num momento seguinte, encontra três deuses. Rá solicita que oferendas sejam entregues aos deuses no submundo, para que se alimentem e se energizem. Doze serpentes são vistas, representando diversos aspectos, como guerreiros ou que promovem renascimento. Elas iluminam o local onde se encontra Osíris, com a chama que sai de suas bocas. Elas protegem o Bom Deus e se alimentam do sangue dos inimigos d’Aquele do Duat.
Por fim, encontra mais doze deuses que carregam o cetro de palmeira, sinal da vida, que se curvam enquanto o Grande Deus passa em direção à próxima região. Rá encontra os deuses vestidos e completos como o próprio Osíris. Esses 24 deuses e deusas acompanham Osíris, o Senhor dos Mortos, junto com serpentes protetoras. A morte é vencida.
Ficam na comitiva solar somente aqueles deuses que não são relacionados à morte e sim à vida, que recebem oferendas e se satisfazem. Estes são os que acompanharão até a saída.
10: Mergulho no Nun (Khat)
O nome da Deusa da décima hora é “A Furiosa que Mata Aqueles Deixados Para Trás”. O nome desta cidade é “A que é Profunda de Água e Alta de Margens”. O nome da porta desta cidade é “Grande das Criações, A Única Geradora das Formas”.
Rá-Khepra descansa em uma caverna na companhia de deuses e espíritos que se lamentam pelas imagens da “Região Silenciosa”. Há um escaravelho chamado “Escaravelho Vivo” segurando um ovo cujo interior tenciona sair no horizonte. O Grande Deus continua seu processo e encontra deuses com coroas do Sul e do Norte, que são responsáveis por chamar aquelas almas sob a terra e purificar seus espíritos através de outras duas divindades: “A Que Eleva e A que Chama os Deuses”, que se ocultam após a passagem de Rá. Em seguida se depara com oito deusas (dentre elas Sekhmet) e um babuíno segurando O Olho. Rá exalta as formas de Sekhmet, as fortalece, e solicita que coloque o Olho em Hórus, para que o deus fique completo e satisfeito, pedindo que permaneça e proteja a integridade do Olho. Novas imagens são vistas pelo Grande Deus, deuses funerários de caráter ocultador e formas de Hórus, que são responsáveis por fazer aparecer os corpos e firmar as ataduras dos inimigos, certificando-se de que aqueles que são contra a ordem cumpram o castigo que receberam no julgamento.
O Grande Deus continua a navegar pela cidade. Ele avista o falcão “Aquele que Governa o Céu” (Provavelmente uma forma de Hórus) em cima da serpente chamada “A Que Inclina as Faces”, cercado por duas deusas do Norte e Sul. Eles indicam o Ba de Sokar, que irá com Rá até o final do Duat e depois se ocultará. Trata-se de outra serpente chamada “ Vida da Terra”
Após, o Criador encontra diversos deuses punidores carregando flechas. Rá os chama pelos seus nomes, fortalece seus corpos, suas armas, e afirma que eles devem caçar os inimigos que ainda restaram, pois agora o Céu Inferior já se encontra pacificado, e na escuridão do Duat ele se prepara para renascer.
Mais adiante, encontra Hórus diante de um grande lago, o lago com as Águas Primordiais do Nun, e passa por esse lago para seguir adiante na sua jornada. Diversos espíritos jazem no Abismo. Hórus os chama, conjura ar para que respirem e comanda que eles saiam da Inundação criativa, ficando de pé: “Vossos corpos estão íntegros e não possui putrefação, vossas carnes não estão decompostas(…)” Por fim, encontra quatro deusas protetivas que iluminam o caminho até que o Grande Deus atravesse a porta para a penúltima região.
Nesta região do Duat, Rá encontra o lago de Nun, onde diversos corpos jazem para renascer. Aqui ele refaz seu corpo físico, o Khat, unindo todas as suas formas. Khepra surge, o sol que irá renascer, o Grande Deus está completo.
11: Sustentação de Khepra — Abertura do Olho
O nome da Deusa da décima primeira hora é “A Estrelada, Senhora da Barca, A que Rechaça o Rebelde Quando Ele Aparece, Senhora da Proteção”. O nome desta cidade é “Boca da Caverna, A Que Enumera os Corpos”. O nome da porta desta cidade é “Lugar de Descanso dos Habitantes do Duat”.
Esta é a penúltima região e já se encontra abaixo da Montanha Oriental, o Horizonte Leste do Céu. Aqui o renascimento físico do Deus Renovado dará início. Atum, a antiga forma de Rá, se manifesta diante do Grande Deus, e devora suas próprias imagens. A Deusa Shedu, da Constelação de Shedu, também aparece e devora imagens. Doze deuses funerários com relação à elevação, sustentação e separação do horizonte aparecem, são responsáveis por elevar os mistérios das transformações de Rá até o céu. O Grande Deus os alimenta, os justifica e os fortalece.
Segue a viagem com a serpente “A Luminosa” na proa, iluminando aquilo que está acima e abaixo. Atrás da serpente, doze deuses relacionados ao movimento, sustentação e elevação levam Rá, que está protegido dentro da “Serpente Envolvente”. O Grande Deus os chama, os fortalece, dá oferendas e comanda que sigam firmes até a Porta Oriental do Horizonte.
Encontra então duas formas misteriosas de serpente. Quando são chamadas pelo nome, aparecem Isis com a Coroa do Norte e Néftis com a Coroa do Sul.
Chegando ao final da região, uma caverna guardada por Osíris (Aquele que está sobre seu ataúde), quatro deusas guardam a Sagrada Porta de Sais, que é desconhecida, invisível e imperceptível. Rá ordena aos que lá estão para que os últimos inimigos de Osíris sejam aniquilados. Aparece Hórus junto com uma poderosa serpente e cinco deusas com poços repletos de inimigos dentro, os amaldiçoando: “Que vossos corpos sejam castigados com facas, vossos Ba’s aniquilados, vossas sombras dissipadas e vossas cabeças cortadas! Não existirão!” No final da caverna, quatro deusas relacionadas à matança sangram os inimigos que sobraram.
Nesta região, Rá encontra aqueles que irão elevar seus mistérios ao céu e fortalece as serpentes que puxaram sua barca e as deixa em seus tronos. Isis e Néftis são as deusas que sustentam Osíris no Duat, elas mantêm a integridade do Bom Deus. Após a sustentação do renascimento, os últimos inimigos que poderiam impedir o Grande Deus de renascer são deixados nos poços em chamas. A Eternidade restitui o renascimento de Khepra na cidade “A Que Enumera os Corpos”, e a deusa da Hora, “A Estrelada e Senhora da Barca”, o guia. O Olho de Rá abre para a verdade, Sua consciência se completa.
12: Elevação de Rá-Khepra
O nome da deusa da décima segunda Hora Noturna em que este Grande Deus volta a existir novamente é “A Que Vê a Beleza de Rá”. O nome desta cidade é “Criação da Escuridão, Chegada ao Nascimento”. O nome da porta desta cidade é “A Que Ora aos Deuses, Exaltação dos Deuses”.
Esta é a ultima região do Duat, onde Rá se prepara para sair do submundo e ser dado à luz no corpo de Nut. Doze deusas estão na proa da barca, são relacionadas ao poder divino e preparador. Mais doze deuses são vistos em adoração na hora que precede a manhã e exaltam a transformação finalizada, e proclamam:
“A terra pertence ao teu corpo, Senhor de Toda Veneração. O horizonte foi tomado, teu lugar está em sua capela. As duas deusas te sustentam em tua forma corpórea. Tuas duas filhas te recebem em suas formas unidas”.
Continuando a viagem, a barca passa pela serpente “Grande Ka”, e o Grande Deus renasce na sua forma definitiva para que possa aparecer diante dos homens. Após a passagem pela serpente, descansa sob a imagem de Shu, que recebe o Deus renascido. Em seguida, a comitiva passa por outra serpente, “Vida dos Deuses”, para que seja garantido o renascimento desses deuses da comitiva. Eles entram na serpente como os Honrados e saem como Jovens de Rá. Eles seguem atrás do Grande Deus quando este sair para o corpo de Nut.
Há treze deusas que recebem a corda que guia a barca quando ela sai da última serpente, e são relacionadas ao renascimento e eternidade. São elas quem guiam a barca no céu. Rá é recebido por Nun/Naunet e Heh/Hehet, são eles quem guiarão o Grande Deus pela porta no horizonte. Rá encontra mais quatro deuses que irão elevar o Grande Disco no Horizonte Oriental do Leste.
Antes do último conjunto de deuses, uma última serpente, a “Fogo nos Olhos”, irá queimar os inimigos de Rá antes de ele sair no horizonte, para que sua saída seja segura. O último conjunto de deuses se encontra na frente de Osíris, Senhor do Submundo, que o saúda e o exalta. Osíris está sob o aspecto Senhor da Vida, o deus renascido.
Antes de sair, o Deus Rá abandona sua forma inicial do Duat, A Carne, que é representada como uma múmia depositada na porta leste.
Nesta última região, Rá passa na coluna (Djed) da serpente “Grande Ka” e nasce como Khepra rejuvenescido. Os deuses da comitiva rejuvenescem como os Jovens de Rá na Serpente Nau. Para preparar a saída, a Serpente “Fogo nos Olhos” queima os inimigos de Rá no amanhecer, para que não o impeçam de sair. Por fim, Rá deixa a forma do Duat para trás (A Carne) e Nut dá a luz Khepra, o Sol Nascente, um novo deus no Horizonte Leste, para que ele possa navegar em seu corpo e reinar durante as horas do dia, iluminando a criação.
Por: Allan Koschdoski
Referência: E. A. W. Budge, “The Book of Am-Tuat,” Sacred Texts, 1905. [Online]. Available: http://www.sacred-texts.com/egy/bat/index.htm. [Acesso em Outubro 2018].